Sobre essa história:

Quando o perigo se mistura à atração, segredos do passado podem custar tudo. Ravenna vive sob a sombra da máfia, tentando sobreviver a cada dia marcada por dor e perdas. Alessandro, o enigmático guarda-costas contratado para protegê-la, carrega um desejo ardente de vingança que ameaça tudo ao redor.

Capitulo 1 – Uma história baseada em ansiedades reais
Olá, pra você que não me conhece meu nome é Lucas, sou fundador do projeto
Psicologia Tarja Preta. Talvez você acompanhe nosso conteúdo desde o início ou tenha
nos conhecido agora. Uma coisa tenho certeza, você nunca soube quem esteve por trás
desse perfil durante esses seis anos de trabalho diário. Nesse capítulo quero contar
minha história do dia que um acidente quase me matou, dos desafios que precisei
enfrentar durante e pós acidente. Como consegui superar as crises de ansiedade,
depressão profunda e quais ferramentas usei para conseguir sair do fundo do poço, da
dor crônica e encontrar meu propósito de vida.
Minha vida antes do acidente.
Morei com meus avós desde um ano de idade. Com isso os
chamo de pai e mãe. Sempre acordava cedo para ajudar
meu avô/pai em uma pequena empresa que eles haviam
criado na garagem de casa. Basicamente, esse
empreendimento consistia em fabricar e vender espetinhos
de bambu para assar carne. O maquinário era simples, uma
máquina cortava os palitinhos e a outra lixava a ponta, tudo
era feito manualmente.
Depois de um tempo, já fazia sozinho todas as partes da
construção do espeto, mesmo aos doze anos, magro e do
peso da folha do coqueiro que tinha na garagem. Fui aquela
criança que comia até os rebocos da parede, mas não
engordava.
Não é que eu gostava de trabalhar fazendo espetinho, até
porque aos doze anos você quer fazer muitas coisas, menos
trabalhar. Mas descobri que ajudando em casa minha avó/mãe deixava ir para a rua fazer
o que mais gostava, andar de skate. Pelo skate sim eu era completamente apaixonado,
mas que o futebol naquele momento. Segue minha metodologia para ir para rua:
- Lucas: mãe posso ir andar de skate lá fora?
- Mãe: Não.
- Lucas: mas mãe eu trabalhei tanto hoje tô cansado...
- Mãe: pra andar na rua não está cansado né? então vai, mas não vai pra muito longe.
Parece fácil contando para vocês aqui, mas a verdadeira luta não era em ir pedir minha
mãe e sim em parar de dar ouvidos ao que a minha mente falava. O mau do ansioso é
criar mil maneiras de dar errado algo que ainda nem aconteceu.
Na escola meu único esporte era o futebol já que não podia levar o skate para a aula.
Herdei as habilidades no futebol do meu pai/biológico que já jogou no time profissional
4
da cidade e quase foi para o time do Cruzeiro. Decidiu não ir para um time profissional
porque naquele período preferia outras coisas entre elas ficar próximo da família.
Hoje meu pai/biológico é empresário no ramo de moda tem uma loja referência aqui em
Patrocínio, Minas Gerais chamada Big Moda. Pai, depois acertamos os royalties dessa
propaganda.
Lembro do início da trajetória do meu pai/biológico e ele sempre foi muito esforçado.
Herdei muitos comportamentos e hábitos positivos, só o nariz de batata que não
precisava. O que realmente importa é ter saúde.
Trabalhei com ele nesse período, quando tinha dez anos, vendendo roupas e edredom,
bem no início, quando ele vendia de porta em porta e nas cidadezinhas da região. Isso
foi importante pra mim já que pude observar desde o início como se inicia uma grande
empresa. Também criei o hábito de guardar o dinheiro que ganhava, pois, como vocês
sabem, sou apaixonado por skate e queria muito ter um profissional em minhas mãos,
ou melhor, em meus pés.
Ganhava R$ 5,00 por sábado que era bastante dinheiro naquele período para uma
criança de dez anos que a única responsabilidade era lavar o cachorro, tirar boas notas
e fazer espetinho com meu avô/pai. Aqueles períodos vendendo por aí no sol quente e
muita poeira, era maravilhoso. Criança não vê dificuldades, não carrega nenhuma
pressão, nem em vender, nem em preocupar se a gasolina dá para ir trabalhar e voltar
pra casa.
Minha função era buscar mercadoria dentro do carro, beber
um cafezinho em toda casa que parávamos pra vender e
ajudar a desatolar o carro em época de chuva. Engraçado que
até os atolamentos eram divertidos, sempre aguardava esses
momentos. Vai entender cabeça de criança. Agora entendo
como surgiu meu atual vício por café se deve por causa das
educadas senhorinhas que viviam me dopando de cafeína.
Voltando para os doze anos, no ano do meu acidente, já estava na sexta série. Nunca fui
o tipo de criança que queria ter a atenção voltada a mim, fazendo bagunça ou tirando
notas extremamente altas. Sempre fui aquela pessoa mediana, nem muito boa nem
muito ruim apenas o suficiente para passar de ano. Digamos que estudar não era algo
que gostava, sempre achei muito chato a metodologia de ensino, vivia perdido em
pensamentos aleatórios durante as aulas.
Algumas coisas despertavam o interesse pelo colégio e me faziam acordar às seis da
manhã na maior paz e alegria, o recreio e educação física. No recreio conversávamos
sobre skate, futebol e jogos online. Aquela relação era sempre agradável, reuníamos
diversas tribos para falar do mesmo assunto. Diversas séries diferentes juntas no mesmo
local para conversar sobre algum dos temas mais legais do momento. Nesse momento
já tinha a necessidade de fazer parte de algum grupo, estar entre eles era legal.
5
Também conversávamos sobre as meninas mais lindas da escola. Não era o aluno
beijador, até porque, meus dentes tortos daquele período não me permitiam ter
autoestima suficiente para desenrolar uns beijinhos. Me sentia mais confortável sendo
um bom ouvinte e ouvindo uma história mais aleatória que a outra daqueles amigos que
a única função deles na escola era tentar conquistar alguma menina.
Futebol também era um assunto que me interessava muito. Na sexta
série fui um dos melhores jogadores de futebol da escola. Sempre
era o primeiro a ser escolhido nas aulas de educação física e quando
tinha dois amigos em times diferentes, um deles não jogava, pois
sabia o que eu iria aprontar.
Nesse momento me sentia importante e retribuía isso jogando bola
no nível Ronaldinho Gaúcho na infância, imitava muito bem, até os
dentes tortos dele.
Lembro de um campeonato interclasse onde chegamos à final e só
perdemos por causa da nossa estrutura corporal de crianças recém-nascidas jogando
contra adultos repetentes do terceiro ano, que haviam acabado de sair da cadeia.
Jogamos contra eles porque derrotamos todas as escolas e vence-los era nosso último
desafio. Óbvio que perdemos, eles desmaiaram quatro jogadores do meu time e
ameaçaram bater na gente no final do jogo. Por humildade e amor pela vida, deixamos
de ganhar esse campeonato.
Muitas pessoas observaram meu desempenho e me chamaram para jogar diversos
outros jogos, até mesmo fora da escola. Me sentia realmente feliz em fazer aquilo que
gostava e era bom. Fazer e investir tempo em coisas que nos fazem se sentir vivos é uma
boa estratégia e eu a usava sempre.
Minha vida durante o acidente.
Na manhã do dia 25 havia faltado da aula e antes de iniciar os trabalhos de apontar os
espetinhos, fui convidado por um amigo que foi até a minha casa chamar para ir ao
centro para comprarmos alguns itens que estavam na moda naquela época, umas
pulseiras e colares coloridos. Pedi minha mãe e fomos durante o caminho ouvindo a
“Qual é – Marcelo D2”.
Cantando e conversando com meu amigo sobre diversas coisas aleatórias, ele que já
trabalhava de carteira assinada e isso era minha próxima meta, já que carteira assinada
ganhava muito bem. Fiquei imaginando conseguir comprar um skate muito melhor do
que eu já tinha. Fizemos algumas rotas de cobrança já que ele estava em horário de
trabalho, antes de irmos até aquela pessoa que muita gente queria ter uma vida igual. O
Hippie que sai por aí conhecendo o mundo e vendendo sua arte. Mas fomos
interrompidos no meio do caminho.
6
Subindo uma das avenidas principais da cidade, que leva até a praça onde ficava o hippie,
fomos em cima do passeio empurrando as bicicletas já que era uma subida forte,
conversando e rindo muito, pois, criança é boba e ri de tudo, chegamos em um lugar
que, por algum motivo, toda vez que passava lá perto, minha atenção voltava totalmente
pra aquele lugar. Era pela exposição de pequenos aviões de controle remoto que tinha
na vitrine. Quando chegamos nessa exposição de aviões de controle remoto paramos
para observar bem de pertinho. Fiquei imaginando como deveria ser divertido pilotar no
controle aquele aeromodelo. Não fazia ideia como funcionava, por isso todas as vezes
que chegava perto daquele lugar, precisava dar uma olhadinha.
Naquela época não tínhamos o acesso à informação como temos hoje, internet era para
poucos, meu celular era um Nokia 1100 que foi roubado com um mês de uso por um
daqueles jogadores de futebol que saiu da cadeia. No máximo jogava o jogo da cobrinha
e ligava usando a técnica dos três segundos para não gastar os meus créditos eternos
de R$ 2,00. Chegando até a vitrine da exposição, subi dois dos quatro degraus para me
aproximar e ver de perto os detalhes dos aviões.
No meio da conversa com meu amigo enquanto apontava para um avião amarelo,
escutei uma mulher gritando muito alto, ela parecia estar do outro lado da avenida. Em
seguida ouvi algo subindo o passeio bem atrás de mim.
Quando me virei vi a traseira de
um caminhão enorme a um
palmo da distância de mim, já
não dava tempo de correr. Ele
estava estacionado um pouco
acima de onde estávamos.
Perdeu o freio e veio até nossa
direção desengatado, sem
motorista, desgovernado,
desviando de todos os outros carros e parando só depois de nos atropelar e ficar em
cima da gente nas escadarias onde estávamos.
Foi tudo tão rápido que em momentos como esse a gente só fica em silêncio enquanto
vê tudo acontece sem poder fazer nada. Algum tipo de medo que nunca havia sentido
antes, começou a surgir de dentro de mim. Acho que era meu cérebro me mostrando
que algo muito ruim havia acontecido. Só o primeiro impacto já quebrou a lateral do
meu corpo. Quando me jogou nas escadas e ficou em cima, terminou de quebrar o
restante.
Assim que o caminhão bateu e me lançou para as escadas, tudo ficou em câmera lenta.
Naquele impacto e literalmente voando fiquei pensando: “Porque isso está acontecendo
comigo?” “Será que vou morrer?”. Como não desmaiei, conseguia ver aquela barra que
fica no fim da parte de trás do caminhão, me pressionando contra a escada e apertando
muito meu tórax me deixando sem ar. Naquele momento percebi que morreria.
7
Fiquei gritando de desespero e chamar o meu amigo que também estava preso ali nas
escadas enquanto ouvia várias pessoas gritando de desespero. Continuei falando até
perder quase toda voz. Isso me desesperou mais ainda porque o que estava tentando
falar era o nome da rua que morava e o nome da minha mãe, para que avisassem ela
que não estava bem, estava com medo. Com o impacto estava alucinando, na minha
cabeça estava sozinho na hora do acidente.
- Moro na rua Olivia de Assis, chamem a minha mãe!
- Por favor avisem a minha mãe que eu estou aqui. Não quero morrer!
- MÃAAE!
Me lembro de todos os momentos do acidente, a única coisa que não me lembro foi
quando tiraram o caminhão de cima da gente. Fico imaginando a dificuldade de quem
foi tentar dar um tranco no caminhão para que não continuasse me esmagando,
qualquer erro podia agravar ainda mais a situação. Após tirarem o caminhão de cima,
meu amigo que teve apenas uma pequena lesão na perna, levantou e ligou para meu
pai, contando sobre o acidente.
Enquanto meu pai não chegava, comecei a ficar com as vistas embaçadas, tentava
explicar que havia quebrado as pernas, já que não conseguia mexer. Aquele momento
foi o mais assustador da minha vida. Me sentia sozinho, estava ficando cada vez mais
fraco e totalmente incapacitado de fazer qualquer coisa pra lutar pela vida. Fazia força
para levantar e não conseguia porque as pernas não mexiam.
Em minha cabeça de doze anos que não entendia nada de anatomia elas não se mexiam
mais porque haviam quebrado. A única coisa que podia fazer para me manter vivo era
lutar para não apagar. Estava fraco, sem força pra falar ou gritar e não enxergava mais
ninguém. Fiquei agonizando no chão, em silêncio e sozinho.
Enquanto a ambulância não chegava, perceberam que por fora havia apenas com uma
escoriação nas costas, por ter caído deitado nas escadarias. Porém, ninguém imaginou
os estragos por dentro que aquele acidente causou. O impacto interno foi destruidor e
tirou muitas coisas do lugar.
✓ 2 fraturas na coluna e medula.
✓ Quadril quebrado.
✓ Grave hemorragia interna.
✓ 4 costelas quebradas.
✓ 2 delas perfuraram meu pulmão e quase o coração.
✓ 2 paradas cardíacas até o hospital.
✓ Destruição completa do meu Psicológico.
8
Lembro das pessoas dizendo depois que fiquei parecendo um camaleão, cada hora de
uma cor. Agora sabemos que isso aconteceu por causa do estrago interno, até porque
não é nada fácil segurar um caminhão no peito com uma estrutura corporal de um grilo.
Era agora um quebra cabeça de doze anos de idade, com algumas peças quebradas e
fora do lugar. Acabei não sentindo dor alguma porque as terminações nervosas da
medula também se romperam junto com todo o resto da coluna e são elas que enviam
sinais, entre eles a dor para o cérebro.
Sem contar também que nosso cérebro em situações de risco de morte, trabalha como
um grande guardião te protegendo e economizando o máximo de energia possível para
que você consiga resistir até a ajuda chegar. Não ajudei muito meu cérebro porque a
energia que ele guardava, gastava gritando. Não existe pensar racionalmente quando a
morte está vindo te buscar mais rápida que o Usain Bolt.
Enfim a ambulância chegou e me levou rapidamente para o hospital. Fui encaminhado
para a sala de emergência para descobrir o que havia acontecido. Naquele momento,
consciente e lutando ferozmente para não morrer, conheci as enfermeiras que já estavam
lá arrumando as coisas para a cirurgia. Eu as ouvia conversarem sobre fatos aleatórias
enquanto arrumavam suas luvas. Acredito que já estavam bem acostumadas com
situações como aquela. Porém pra mim, naquele momento, parecia que elas não
importavam ou no fundo só queria alguém pra chegar perto de mim e dizer que ficaria
tudo bem. Estava morrendo e elas falando dos namorados que as traíram.
No mundo mental estava travando uma batalha interna contra a morte. Ela estava com
uma foice doida pra me pegar e eu me defendendo com um chinelo havaiana que usava
durante o acidente. No mundo real meu pai conversava com o médico sobre as
consequências da cirurgia já que eu estava quase indo ver Jesus. Médicos são bem
diretos ao ponto e orientaram que se a hemorragia fosse algum órgão vital, como
coração, não teria o que fazer.
Iniciaram a cirurgia depois de uma conversa de alguns segundos com meu pai e
descobriram que a hemorragia era apenas uma veia que havia estourado. Nesse
momento não corria mais aquele risco e podia me preparar em paz para outro risco de
morte que havia aparecido após a cirurgia.
Após os procedimentos cirúrgicos fiquei
na UTI, meio perdido de tudo ainda. Meu
medo de morrer era tão grande que
mesmo após o acidente e a anestesia geral
da cirurgia, acordei e fiquei o tempo todo
com os olhos arregalados. Sempre
observava alguém chegar e olhar por
baixo da minha cama. Depois descobri que
ali tinha uma bolsa para drenar o sangue
da hemorragia.
9
Estavam olhando a hemorragia que não estava sendo contida como previsto pós cirurgia.
Todo sangue que injetavam, estava descendo redondo e direto para a bolsa.
Avisaram a família que teriam que me abrir novamente e devido meu estado todo
quebrado e pós uma cirurgia, não teria forças para suportar mais uma. Imagina uma mãe
e um pai, com seu filho, pós acidente lidando com a seguinte opção: ou espera o
sangramento parar e correr o risco de morrer ou vai pra outra cirurgia e ainda assim,
correr o risco de morrer. Felizmente, depois oito bolsas de sangue, o sangramento parou.
Me encaminharam para UTI de Uberlândia para fazer a cirurgia da coluna e quadril.
Sou apaixonado em viajar, mas deitado em uma maca de madeira, com a coluna, costela,
quadril quebrado e recém operado, não foi uma viajem agradável. Foram os 140 KM mais
horríveis da minha vida, nesse momento gostaria de ter a paz das enfermeiras que me
atenderam no dia do acidente. Já na unidade de Uberlândia fiquei isolado, igual aquelas
pessoas de filmes de apocalipse zumbi que o vírus ou a mordida pode contaminar outras
pessoas. Se fosse assim teria ameaçado morder aquelas enfermeiras para que fossem
mais humanas comigo. Já foi possível perceber meu leve rancor devido à falta de amor
ao próximo daquelas enfermeiras enquanto eu morria? Espero que sim.
Na verdade, não sei porque fiquei isolado, talvez queriam estudar minha super força de
parar um caminhão no peito e sobreviver. No quarto percebi as diferenças de uma
unidade para outra. Na UTI de Uberlândia tive acesso a um ar condicionado que ficava
ligado 24 horas por dia. Até aí tudo legal se não fosse minha febre de 40 graus que
também era 24 horas por dia. Tudo que queria era duas jaquetas de couro me
esquentando, mas meu pedido excêntrico foi negado já que não se esquenta alguém
que está com 40 graus de febre.
Depois de dois dias já estava com as coxas tão inchadas que não conseguia ver meus
pés. Não conseguia olhar para outros lados já que a coluna necessitava de uma reforma.
Meu pai estava ficando na casa de um amigo e sempre ia me ver uma vez por dia, pela
manhã. Nunca gostei tanto de acordar cedo, já que era o único momento que encontrava
com alguém que conhecia e não usava roupa branca.
Minha mãe não estava preparada emocionalmente para ir me ver, mas mesmo assim foi.
Recomendaram a ela para não chorar ao me ver, mas quem chorou foi eu. Fiquei muito
feliz por ter minha mãezinha comigo naquele momento. Os dias foram se passando e fui
perdendo muito peso por tomar apenas soro e medicação para dor. Uma hora ou outra
as dores iriam aparecer para recuperar a ausência no dia do acidente. Emagreci quinze
quilos, porém, minhas pernas continuavam inchadas e grossa igual a Gracyanne Barbosa.
No período da manhã era o dia que as enfermeiras me davam o famoso banho de gato.
Eram os banhos mais dolorosos que já tomei porque precisavam me virar de lado para
lavar minhas costas, mesmo com muitos ossos fora do lugar. Consigo lembrar da dor e
era insuportável. Imagine precisar ficar manuseando seu corpo pra lá e pra cá com alguns
ossos fora do lugar. Não dormia por dor, estava com frio devido os quarenta graus de
febre, tinha sede pois desde então não havia tomado água e precisava de banhos
diariamente as seis da manhã. Logo eu que só tomava banho aos sábados.
10
Brincadeira.
Um dia antes da minha cirurgia na coluna, reuniram
todos os médicos no quarto para ter aquela conversa
sincera e como vocês sabem, eles são muito bons nisso.
Me disseram que a chance de conseguir voltar a andar
novamente já não existiam mais. Fariam o possível para
que pudesse voltar pelo menos a sentar novamente. Vou
ficar na cadeira de rodas pelo resto da minha vida? Era
meu único pensamento.
Após dez horas de cirurgia reuniram minha família
novamente para confirmar o que haviam previsto, realmente ficaria na cadeira de rodas
pelo resto da minha vida. Porém, conseguiram que a cirurgia me possibilitasse
futuramente voltar a sentar depois de alguns meses de fisioterapia. Esse bombardeio de
situações que precisei lidar aos doze anos de idade, acidente, quase morte, paraplégico,
não fez muito bem para a minha saúde mental. Fiquei pensando muito do porquê de
tudo isso acontecer comigo dessa maneira. Tudo que eu procurava era respostas e
alguém para culpar. Era apenas uma criança, que nunca tinha feito mal a ninguém para
receber um “castigo” dessa proporção. Estava completamente perdido e com medo.
Após alguns dias de observação fui encaminhado para outro quarto onde pude sair da
quarentena e socializar com outros seres vivos. Já não havia mais chances de transformar
alguém em zumbi sem coluna. Nesse quarto continuei em observação e tomando
medicações pós cirúrgica. Sem contar que estava com a presença da minha mãe que
dessa vez já podia ficar o tempo todo comigo. Essa mulher guerreira enfrentou tudo
comigo a partir daqui. Puxei a resiliência dela.
No quarto de espera conheci muitas pessoas, uma
delas foi o Davi. Tinha sete anos de idade, um
cabelo muito bonito e hidratado, olhos verdes e
uma animação fora do comum para quem estava
no hospital cheio de gente lascada fisicamente e
emocionalmente. Toda vez que o procurava a
minha direita, ele estava próximo a cama de
alguém, conversando sobre algum desenho
animado. Até então eu não sabia o motivo pelo
qual ele estava internado, parecia tão alegre e com
tanta energia que eu o via mais como alguém que
estava lá infiltrado para mudar o clima do ambiente.
Me acordaram como de costume as seis da manhã para aplicar medicação. Enquanto
aplicavam, olhei para o lado e vi também acordado o Davi, só que dessa vez ele estava
totalmente o oposto de como geralmente se comportava quando acordava.
Estava triste sentado na cama com as pernas balançando no ar, como se estivesse ansioso
por alguma coisa. Até que entrou uma enfermeira no quarto, foi até a cama dele e
11
conversou um pouco, não consegui ouvir nada. Davi logo começou a chorar e não
entendia o porquê. Até que alguns minutos depois, chegou outro rapaz com algumas
máquinas de salão para cortar o cabelo dele, no zero. Davi tinha câncer aos 7 anos. A
partir desse dia foi como se tirassem de dentro dele, toda a energia e vitalidade.
Acredito que o fato de não entender bem o que é o câncer, não se deixou abalar. Porém,
ao rasparem sua cabeça o deixou bastante triste, pois muitos elogiavam aquele cabelo.
Não faço ideia do que tenha passado na cabeça dele, porém, aprendi aquele dia que
assim como eu, existiam diversas outras pessoas com dificuldades extremas e até piores
que a minha. A gente sempre pode aprender com a história do outro. Recebi alta e nunca
mais tive notícias dele, espero que tenha vencido a batalha.
Minha vida pós acidente/reabilitação.
Já estava mais que ansioso para voltar pra casa
depois de tanto tempo fora. No percurso de
volta para minha cidade, me senti
extremamente bem, tanto que dormi dentro da
ambulância como nunca havia dormido nesses
últimos dois meses desde o acidente. Minha
mãe e meu tio estavam comigo e tudo que
sentia era paz, finalmente tudo voltaria ao normal. Assim que chegamos em casa, abriram
a porta da ambulância, e estava cheio de pessoas aguardando a minha chegada. Fiquei
feliz pois parecia que havia ganhado a copa do mundo e agora voltava pra casa com a
taça na mão.
Alguns amigos que andavam de skate comigo, outros que jogavam bola, me aguardavam
em casa. Fiquei feliz, mas naquele momento só queria meu quarto e minha cama, estava
cansado daquele clima hospitalar, cheio de máquinas e cheiro de ambiente esterilizado.
Queria deitar de barriga pra baixo, como sempre dormi. Pegar a minha coberta, que
juntamente com o meu colchão, tinha o formato perfeito do meu corpo de tanto dormir.
Mas tive uma surpresa quando cheguei ao meu quarto.
Me carregaram na maca até meu quarto e ao chegar dei de cara com outra cama de
hospital, meu quarto estava totalmente alterado, não havia mais nada do que havia
deixado antes de sair de casa no dia do acidente. Meu skate que ficava escorado do lado
da cama não estava mais, meus tênis rasgados de tanto andar também não, aquele
cheiro de chulé exalando pelo quarto, havia sumido. Apenas uma cama igual as da UTI,
uma televisão e um quarto esterilizado. Parecia que havia chegado em outro hospital.
Tão limpo que os mosquitos passavam álcool em gel para poder sobrevoar aquele
território. Minhas crises de ansiedade e depressão profunda foram sendo aos poucos
construídas por diversos fatores da nova realidade que tive que encarar. A cada dia que
passava a ficha de tudo que aconteceu foi caindo, não estava preparado
psicologicamente para lidar com ela, acredito que ninguém estaria.
12
Não ter liberdade de ir e vir quando quiser era horrível. Queria meus movimentos da
perna só para poder pegar meu skate e ir para algum lugar, longe daquele cheiro de
álcool e aqueles rostos de tristeza ao me verem naquela situação.
A alteração do meu quarto foi necessária já que ainda estava com pontos na cirurgia da
coluna, precisava do máximo de cuidados possíveis para não pegar alguma infecção
generalizada. Na cabeça daquela criança de doze anos tudo que queria era que voltasse
a ser como era antes. A cada novo choque de realidade um caminhão atropelava minha
saúde mental e o pior é que não estava conseguindo ser forte o suficiente para resistir
aos estragos psicológicos. Os efeitos colaterais dessa nova realidade me jogavam para
um buraco cada vez mais fundo.
Quando amanheceu o primeiro dia em casa, após
mais uma noite sem dormir praticamente nada,
chegou uma pessoa que nunca vi na vida em meu
quarto, se chamava Daniela. Seria minha
fisioterapeuta pelos próximos meses. Com ela,
descobri que mulher quando quer fazer alguém
sofrer consegue fazer isso com um olhar sereno e
muita paz de espírito. Era assim que a via enquanto
me torturava com os alongamentos.
Quando ela chegava já pegava meu travesseiro para colocar no rosto e ficar mordendo,
chorando e gritando de dor. Até entendia a dor porque já estava a dois meses
completamente parados sem movimentar nenhum músculo da cintura pra baixo.
Qualquer movimento por menor que fosse era muito dolorido. Se não agissem rápido
poderia ficar todo atrofiado. Por isso contrataram uma profissional para iniciar as sessões
assim que voltei da primeira parte da batalha.
Nos dias atuais agradeço muito a ela e a fisioterapia, porém, naquela temporada de
exercícios todos os dias, só fazia despertar meu desejo de matar alguém de tanto ódio,
dor e sofrimento. O interessante é que tudo isso era só o começo. Não fazia ideia de
quanta coisa teria que encarar e que essas dores com a fisioterapia, não eram nada
comparado ao que estava por vir.
Além das dores durante a fisioterapia, sofria com as dores pós fisioterapia. Os exercícios
estimulavam o sistema nervoso, sentia choques semelhante a cólica, só que no músculo
da perna. Variava de um lugar para outro e era completamente insuportável oscilando
de intensidade de acordo também com fatores emocionais e físicos. Quando algo no
corpo dói geralmente colocamos a mão para pressionar e tentar amenizar a sensação.
Como não tinha movimento, geralmente ficava deitado enquanto a dor agredia.
Não conseguia me mover direito e sem contar que as dores aconteciam onde não sentia
completamente nada, como por exemplo, meu pé. Assim como as cólicas menstruais nas
mulheres vão irritando, meus choques também alteravam completamente meu humor já
que ninguém consegue ficar feliz sentindo dor o tempo todo. Nunca entendi essas dores,
13
nem os médicos, só sei que tudo começou quando a fisioterapia iniciou. Daniela dizia
que as dores eram um bom sinal.
Depois de uma semana não suportava continuar fazendo mais nada, além da dor do
momento me afundava ainda mais na dor pós fisioterapia, principalmente à noite ao
dormir, odiava com todas as minhas forças tudo aquilo que vivia. Como não tive a
resposta que queria de cancelar a fisioterapia para não sentir mais dores, comecei a parar
de conversar tanto com a fisioterapeuta como com qualquer outra pessoa da minha
família como forma de protesto.
O ódio no coração e as dores me consumiam, não conseguia entender que aquilo era
para o meu bem. Na cabeça daquela criança não fazia sentido algum precisar sofrer tanto
daquela maneira. A fisioterapia continuou por alguns meses, não parou nem no natal. Já
não conversava com ninguém, nem com a pessoa que mais me dava amor e cuidava de
mim naquele momento, minha mãe. Com o silêncio comecei a internalizar todo aquele
sofrimento, toda raiva não era jogada pra fora, já não conseguia falar mais sobre esse
assunto, já havia desistido. Não falar começou a me levar para lugares muito escuros em
minha mente, cogitando até a ideia de tirar a própria vida para acabar com aquele
sofrimento já que parecia que ninguém se importava com a minha dor.
Apesar de tudo minha mãe nunca desistiu e sempre fazia o impossível para que tivesse
um pouco de bem-estar por mais difícil que fosse. Ela também que se preocupou com
todos os detalhes desde a higiene do quarto para a minha chegada e fazia todas as
visitas limpar bem as mãos e os braços com álcool em gel evitando o máximo possível
que eu contraísse alguma bactéria, qualquer vacilo poderia piorar tudo já que minha
imunidade estava muito baixa.
Ela que se preocupou em contratar a fisioterapeuta para fazer diariamente os exercícios
para não ficar atrofiado pelo resto da minha vida. Hoje adulto, queria voltar no tempo,
naqueles momentos em que ela entrava no quarto com todo amor do mundo e atenção
pra me oferecer e no lugar do silêncio e da cara fechada por estar afundado na tristeza,
dizer que tudo ficaria bem, que a pessoa que me motivava a continuar lutando era ela.
- Mãe...
- Oi filho...
- Obrigado por não desistir de mim. Eu te amo.
Minha mãe deixou de viver a vida dela para viver a minha, mesmo quando ela entrava
no quarto só para perguntar se estava tudo bem e eu não a respondia. Minha única
resposta era uma expressão de raiva por estar vivo. Minha mente era uma mistura muito
grande entre perceber que estava dando trabalho e que permanecer vivendo com tantas
dores, era algo que já não suportava mais. Preferia muitas outras coisas, menos estar ali
diariamente feito um peso para toda minha família.
Dessa maneira comecei a entrar no estado mais profundo da depressão e ansiedade. A
cada dia que passava meu mundo desabava mais e mais. Já não dormia, não comia bem
14
e não conversava com ninguém. Não socializava, cortei todas as visitas e só continuei
fazendo fisioterapia porque a Daniela não ligava se queria ou não, ela sabia que os
exercícios seriam fundamentais e por isso não ligava para minha cara de ódio e dor.
Depressão é quando você não liga muito, pra nada.
Ansiedade é quando você liga muito pra tudo.
Sobre a depressão e a crise de ansiedade, entenda que, para ser afetado por essas
doenças você não precisa necessariamente ter vivenciado algum grande impacto
negativo na sua vida como o meu acidente. Um dia você pode acordar e perceber que
tudo que você mais amava fazer, não tem nenhum sentido mais. Perceber que sua vida
está passando como um filme na sua frente e você não consegue mais ser o protagonista
dela.
São doenças silenciosas que alimentam das fraquezas e do medo, sugando cada gota da
saúde mental. Tornando isso grandes monstros dentro de nós, tomando as rédeas de
nossas vidas e guiando nossos passos para um buraco escuro e sufocante. Você não
precisa esperar alguma coisa acontecer para buscar ajuda e cuidar da sua saúde mental.
Terapia por exemplo é igual ir para academia, nela você exercita bons pensamentos e
hábitos poderosos capaz de construir uma mente forte e definida.
Quando minha família finalmente decidiu buscar ajuda terapêutica, minha situação
mental estava crítica. Assim como muitas famílias a minha também não entendia muito
bem o que a crise de ansiedade e depressão eram capazes de fazer.
Antes de iniciar a terapia continuei enfrentando tudo
em silêncio, sem saber como me livrar de todas aquelas
sensações de tensão muscular, insônia, calafrios e
sensação de que algo ruim aconteceria a qualquer
momento. Certo dia estava em casa pensando coisas
negativas, até que alguns amigos que andavam de
skate comigo, apareceram após algum tempo para me
chamar para sair de casa e ficar na rua para vê-los andar
de skate.
Isso provavelmente foi uma jogada da minha mãe para me tirar de dentro do quarto já
que estava quase virando parte dos móveis de tanto tempo lá dentro.
Acabei indo porque skate era importante e através da fisioterapia já conseguia ficar
sentado por algum tempo sem sentir dor. Fiquei observando o pessoal mandar algumas
manobras foi quando de repente tudo ficou em silêncio novamente como no dia do
acidente. Não ouvia nada, apenas conseguia ver meus amigos sorrindo em câmera lenta.
De repente me veio um pensamento, como uma bomba nuclear me dizendo: “Você
nunca mais poderá andar de skate”.
15
Foi nesse dia que a ficha caiu por completo e realmente entendi que não conseguiria
mais voltar ao “normal”. Isso fez criar um vazio duas vezes maior do que já existia, dando
tudo que precisava para a depressão e ansiedade me arrastar de vez para o buraco. A
partir disso voltei para o quarto e chorei por vários dias tentando encontrar motivos para
a vida ter me tirado tantas coisas de uma só vez.
Após esse dia minha mãe percebeu que voltei para o
quarto pior do que sai. Foi então que procurou ajuda
de um profissional da Psicologia para cuidar da minha
saúde mental e tentar entender o que me fazia ficar tão
“triste” durante tanto tempo. Sou grato a essa decisão
da minha mãe, pois foi aqui que minha história
começou a tomar uma nova direção.
O psicólogo começou a me atender em casa,
semanalmente. No início, assim como não conversava com ninguém também não
conversava com ele. Porém a terapia é uma ciência tão poderosa que eu comecei a me
desarmar e a falar com o Léo, psicólogo, sobre tudo o que eu pensava naquele momento
da minha vida. O auxílio dessas três pessoas em minha vida, Daniela Fisioterapeuta, Léo
Psicólogo e minha Mãe Terezinha que nunca desistiu, foram fundamentais para que
continuasse vivo, porque no fundo, tudo que queria, era colocar fim a todo aquele medo
e toda dor e angústia causado pela ansiedade e depressão.
Após algumas outras sessões com o terapeuta a minha forma de pensar sobre a vida foi
transformando, passando de alguém que não queria estar vivo, para alguém que topou
o desafio de encarar essa nova fase da vida de cabeça erguida e sem medo. Minha
relação com a fisioterapeuta melhorou tanto que viramos grandes amigos confidentes.
Daniela foi a minha única nova amiga já que todos os outros daquela época, seguiram
seus caminhos. Precisei pegar na mão de todos que ofereciam ajuda para conseguir sair
daquele buraco que as crises de ansiedade e depressão haviam me colocado.
O tempo passou e no dia do meu aniversário de treze anos
recebi um presente especial. Um pequeno músculo da
minha coxa esquerda, podia se mexer se fizesse um pouco
de força. Todos nós fomos ao delírio já que até então não
tinha nenhum movimento da cintura para baixo. Isso era
sinal de que as coisas estavam melhorando.
Esse momento foi importante pois mostrou que tudo o que
queria estava depois do medo. Precisava encarar a vida de
uma maneira diferente, tinha que dar um passo a mais e não só ficar me perguntando
do porquê de ter sofrido esse acidente, parar de ser vítima e me tornar protagonista da
vida. Decidi apertei o botão “turbo” em minha mente para acelerar minha evolução nessa
nova etapa da vida e isso transformaria minha vida.
Sem reclamar e com um pensamento positivo do que poderia colher futuramente,
continuei a fisioterapia e os atendimentos com o psicólogo. Iniciei também hidroterapia
16
e até pensei em fazer Eco terapia que é uma técnica onde trabalha o equilíbrio andando
de cavalo. Isso ajudaria, mas acabei desistindo porque precisava andar pelas ruas do
bairro e minha autoestima não me permitia ficar em evidência por muito tempo. Optei
por fazer o que já fazia em casa e na clínica de natação.
Minha evolução física e mental começou a ter um efeito positivo com o decorrer dos
meses. Em certo momento já estava conversando com todo mundo sem problema algum
e já não tinha pensamentos negativos como tirar minha própria vida. Aprendi a lidar com
meus medos e crises de ansiedade depois de apanhar por tanto tempo para essas coisas
que me faziam acreditar que era fraco, incapaz e que meu fim estava cada vez mais perto.
Criei determinação para tentar andar com um andador, já que havia começado a ter força
no quadril. Mas com o tempo descobri que tentava pela minha família e não por vontade
própria. Me ver voltar a andar novamente era algo que eles queriam muito, assim como
achei que também era o que queria, até perceber que não.
Era extremamente difícil pois não voltei com todos os movimentos, praticamente me
arrastava e apoiava meu corpo o tempo todo com a força dos braços. Sem contar que
essas atividades diárias disparavam as dores na perna logo após os exercícios e duravam
o resto do dia. Já estava cansado de sentir tanta dor e entrar naquele ciclo irritante de
não comer e não dormir por isso.
Esse looping de dor durou um bom tempo e já estava completamente esgotado, só
queria paz. Resolvi abandonar esse desafio de voltar a andar e encarar a vida sentado
em uma cadeira de rodas pois só eu sei como era difícil viver daquele jeito. Estava
disposto a encarar o que viesse pela frente. Pensei em mim, dessa vez peguei as rédeas
da minha vida. Agora sem dor e com uma boa saúde mental sendo construída, comecei
a conseguir pensar em outras coisas positivas. Lembro de ler uma frase que me
influenciou muito nessa decisão.
“Onde quer que você esteja, esteja lá por inteiro. Se você acha insuportável o seu
aqui e agora e isso te faz infeliz, há três opções: abandone a situação, mude-a ou
aceite-a totalmente. Se você deseja ter responsabilidade sobre a sua vida, deve
escolher uma dessas opções e deve fazê-lo agora. Depois arque com as
consequências. Sem desculpas. Sem negatividade.” Eckhart Tolle
A partir dessa decisão comecei a realmente viver para mim pois quem sabe até onde
conseguimos ir somos nós mesmos. Alguma coisa em meus pensamentos me mostrava
que não precisava andar para conquistar tudo o que queria. Precisava desse tempo para
conhecer quem era o Lucas daquela nova fase e até onde estava disposto a ir. Quais
eram as coisas que conseguia fazer e as coisas que não conseguia. Quais eram os limites
de um cadeirante? Estava em um processo de construção, em uma etapa de
autoconhecimento de vários novos desafios que iria encarar. Durante esse processo
descobri que os limites são imaginários.
17
“Os limites não são físicos, são mentais. Se você acredita que pode ou que não
pode, assim será.”
Mesmo com a autoestima abalada por estar muito a baixo do peso e em uma cadeira de
rodas, resolvi tomar mais uma pequena atitude e voltar para a escola para concluir os
estudos. Após concluir o ensino médio, decidi outra pequena atitude de começar um
curso de assistente administrativo e foi nesse ambiente que comecei a descobrir algumas
habilidades pessoais. Em uma prova mensal, o trabalho do meu grupo era criar uma
empresa e apresentar na frente para os outros alunos. Criei toda a empresa, logomarca,
vídeo de apresentação sozinho e deixei a apresentação para os outros membros do
grupo. Éramos quatro, dois faltaram, ficou apenas eu e uma amiga que estava bem tímida
em apresentar.
Tomei mais uma pequena atitude, fui apresentar sozinho com medo e imaginando
milhares de coisas sobre o que as outras pessoas poderiam achar de mim e do trabalho,
já que estar na frente de uma sala você está totalmente exposto. A mente de um ansioso
cria julgamentos imaginários de quem está assistindo. Por incrível que pareça, após
concluir a apresentação, todo mundo gostou do trabalho. Fui elogiado pelo professor
pessoalmente e vi no olhar das pessoas o quanto elas me acharam “foda” por ter feito
algo tão criativo.
Naquele momento tive uma emoção muito forte de que era capaz de fazer o que
quisesse e aquilo tomou conta de uma maneira extremamente forte dentro de mim.
Assim como você acredita que o céu é azul comecei a acreditar que era capaz de colocar
a mão em algo e transformar aquilo em prosperidade, seja negócios, pessoas ou uma
página de Psicologia no Instagram. Tudo começou através de uma pequena atitude.
Após concluir o curso de assistente administrativo, decidi cursar administração, depois
psicologia e entre esse período, tirar carteira e comprar meu próprio carro. Decidi
também empreender como micro franquiado e liderei uma equipe muito grande. Falei
sobre negócios para mais de 300 pessoas em um palco. Sai da casa dos meus pais para
me desafiar novamente, dessa vez morando sozinho. Fui de um momento totalmente
desestruturado emocionalmente e fisicamente para ser visto como alguém que era
exemplo a ser seguido, não só por ter resiliência, mas por ser uma pessoa de bom
coração.
Você não sabe a força que tem até que a sua única opção é ser forte.
A cada dia era uma nova pequenas atitude em direção ao que queria. Comecei a fazer
tudo que faria como se não tivesse sofrido o acidente, como se não tivesse vivenciado
nada daquele sofrimento e como se não estivesse preso em uma cadeira de rodas. Minha
busca era por coisas que faziam me sentir cada vez mais vivo. Descobri que a motivação
não aparece quando você está sentado querendo mudar sua vida, você só a encontra
quando começa a agir, quando supera o medo da rejeição e do que vão pensar de você,
18
depois que você se permite ir mais longe sem olhar pra trás as coisas começaram a
acontecer.
Percebi que você pode ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado com diversas coisas
algumas vezes, mas não se esqueça de que a sua vida é a maior empresa do mundo. Só
você pode evitar que ela vá a falência. Há muitas pessoas que precisam de você, admiram
você e querem que você esteja ali para viver o melhor dessa vida que está por vir.
Gostaria que você sempre lembrasse que ser feliz não é ter um céu sem tempestades,
caminhos sem acidentes, trabalhos sem cansaço, relacionamentos sem decepções. Ser
feliz é encontrar força no perdão, esperança nas batalhas, segurança no camarote do
medo, amor na loucura que é isso que chamamos de vida.
Ser feliz não é só valorizar o sorriso, mas também refletir sobre a tristeza. Não é apenas
comemorar o sucesso, mas aprender lições nos desafios e nos fracassos. Não é apenas
ter alegria com os aplausos, mas sim encontrar alegria no anonimato. Ser feliz é
reconhecer que vale a pena viver a vida, apesar de todos os desafios, incompreensões e
períodos de crise. Ser feliz não é uma fatalidade do destino, mas sim uma conquista de
quem sabe viajar para dentro do seu próprio ser. Ser feliz é deixar de ser vítima dos
problemas e tornar-se um ator da própria história.
19
Capitulo 2 – Verdades que não te contaram sobre a
ansiedade.
Você já deve ter lido e ouvido muitas especificações técnicas sobre o que é ansiedade.
Talvez tenha ficado confuso com tantos termos usados pela psicologia e outras ciências.
Acredito também que você já tenha vivenciado uma crise ou tenha alguém bem próximo
sofrendo com essa doença.
Trabalho com sucesso através do projeto
Psicologia Tarja Preta no Instagram, a
distribuição de conteúdo gratuito diariamente
sobre ansiedade, depressão e outras doenças.
Com isso, conquistamos um público muito
grande que diariamente está interagindo e
compartilhando suas experiências e histórias.
A ideia por trás do perfil é transmitir a
mensagem da maneira mais clara possível para
atingir e orientar o maior número ansiosos e
depressivos. O interessante de tudo isso foi que
a ideia da página surgiu como um desafio
pessoal durante o curso de Psicologia.
Em outro capitulo vou contar como conectei
tantas pessoas que enfrentam a ansiedade e
depressão todos os dias em um mesmo lugar.
Durante cinco anos reuni tudo o que vivi e estudei para construir esse livro e compartilhar
a minha experiência com você. Trabalhei sem parar por alguns meses para te entregar
um material objetivo, sem enrolação e de maneira clara. Vou te mostrar tudo que fiz e
faço nos mínimos detalhes para conseguir controlar essa doença capaz de nos levar para
os buracos mais profundos.
Quero que você absorva o máximo de conhecimento sobre essa doença já que muitas
pessoas não sabem como surge, de onde vem ou quanto tempo pode durar tudo isso.
O medo a insegurança e o stress são sempre presentes na vida de quem carrega consigo
essa palavra de nove letras, tão forte quanto um furacão grau 5 girando e destruindo
tudo que há dentro de nós.
20
O que realmente é ansiedade?
Usando um meio de comunicação diferente e acessível consegui chegar até o coração
sufocado daquela pessoa que insistia em perguntar o que estava acontecendo com elas
mesmas. Noites e noites sem dormir se perguntando o porquê de passar o dia todo
cansada e ao chegar na cama, perder o sono.
Se perguntando o que era aquela dor no peito ou aquela dor nas costas. Descobri que
essa maneira de me comunicar ajudou diversas pessoas a se encontrarem e a trazer para
consciência o que realmente estava acontecendo com seus corpos e suas mentes. Vou
te contar algumas verdades sobre a ansiedade.
Ansiedade é necessitar ficar na cama o dia todo para evitar bater de frente com a vida.
É se sentir preso em si mesmo. É sentir o respirar três vezes mais difícil. É ver aquilo que
ainda não aconteceu, acontecendo 365 vezes, da pior maneira possível.
Ansiedade é querer pra ontem, sentir aquele sentimento
intenso e ao sentir, ficar com medo de tudo aquilo te
destruir e no mesmo minuto decidir abrir mão mesmo que
a maior vontade seja ficar. É ser alguém que a cada dez
pensamentos sobre algo, nove são negativos, pensando
coisas que jamais aconteceriam. É ter uma mente
especializada em destruir qualquer vestígio de saúde
mental.
Ansiedade é querer ficar sozinho em um canto ou no quarto para não precisar explicar
que aquela crise não é frescura ou falta de Deus. Porém também querer alguém que me
abrace e me diga que nada daquilo que estou pensando vai acontecer, que eu não vou
morrer, que eu vou vencer e que tudo isso não é "besteira".
Ansiedade é você começar a chorar compulsivamente até soluçar sem saber o porquê.
É ficar deitado na cama por trinta minutos se perguntando o porquê de não conseguir
dormir. É o nó na garganta que aparece de repente. É saber que não existem motivos
para pensar tanto, mas pensar mesmo assim. É imaginar o passado o presente e o futuro
tudo junto, girando sem controle em minha mente.
21
Ansiedade é depois de horas tentando dormir, acordar no meio da noite com vontade
de chorar. É decidir não fazer nada, quando se tem tudo pra fazer. É sentir a cabeça o
peito e as pernas doer sem motivos. É automaticamente os olhos encherem de lágrimas
quando alguém pergunta se está tudo bem. É sentir os pulmões 3 vezes menores,
dificultando a respiração.
Ansiedade não é "amanhã tenho um trabalho muito importante". O
ataque de ansiedade é "do nada", você sente como se um caminhão
apertasse seu peito, te fazendo sentir dor e falta de ar. Não é "hoje vou
sair com aquela pessoa". A crise de ansiedade vem em forma de
agressão mental, tirando seu equilíbrio e te fazendo questionar se tudo
aquilo que você está vivendo, faz realmente sentido. Mas mesmo assim,
você continua lutando, com as forças que tem, porque sabe que tudo
isso vai acabar.
Ansiedade é estar sentado, em silêncio e sua mente parecer uma escola
de samba de informações. Sem conseguir silencia-la, sem conseguir
acalma-la.
Ansiedade nunca foi fraqueza ou sinal de um espírito fraco e sim sinal de que você foi
forte demais por muito tempo. Está tudo bem chorar, está tudo bem. Você não é fraca(o)
por isso.
Ansiedade é precisar continuar viva e forte, pois, existem outras pessoas dependendo
de você, mesmo quando você precisa mais ser ajudada do que ajudar o próximo.
Ansiedade é querer que a dor e o sofrimento pare, custe o que custar. É não suportar
vivenciar repetidas vezes tragédias em sua mente que provavelmente nunca vão
acontecer. É querer colocar um fim a angustia, um fim a falta de ar e um fim ao que
insiste em te destruir diariamente.
Ansiedade é acabar deixando para depois afazeres importantes e ficando mais ansioso
ainda por estar procrastinando e não saber como sair desse ciclo constante.
Ansiedade é dormir poucas noites devido a ansiedade e insônia e acordar cada vez mais
sem forças para lidar com esse ciclo vicioso que parece nunca ter fim.
Viver tudo isso faz com que você se sinta sem forças, mas entenda, não é o fim e eu vou
te mostrar isso através deste livro. Você vai vencer e eu vou te mostrar como. Basta você
dizer sim para você e sua vontade de destruir tudo isso que atormenta a tantos anos.
É completamente aceitável ficar vivo por motivos minúsculos. Porque você quer ouvir
sua música favorita mais uma vez. Porque seus bichinhos vão sentir a sua falta se você
for embora. Porque a lua é simplesmente bonita demais para nunca mais ser vista.
Porque você ainda não viu a próxima temporada da série que você adora. Porque você
ama as luzes de natal, e quer esperar pra ver a cidade toda iluminada esse ano. Se você
está vivo, você está lutando o suficiente. Se você está sobrevivendo, eu tenho orgulho
de você.
22
A minha preocupação é normal ou eu tenho transtorno
de ansiedade?
Você já deve ter se perguntando diversas vezes se o que você sente é uma ansiedade
normal, comum entre todos os seres humanos ou se o que você vive é a ansiedade em
um nível maior, chamada transtorno de ansiedade. Muitas vezes vivemos anos sem
identificar de fato o que realmente está acontecendo com nosso corpo, nosso organismo
e nossa mente. Por vezes me peguei perdido diante de sentimentos que vivenciei toda
minha pré-adolescência e início da fase adulta.
Por falta de informação, nunca soube diferenciar o que seria uma ansiedade comum de
um transtorno. Acredito também que até hoje, muitas pessoas já possam ter vivido ou
que talvez até hoje viva, sem ao menos saber que aquilo se trata de uma doença. Já é
tão “normal” viver daquele jeito que é como se o certo seria aquela forma. Não tem como
você identificar algo que não conhece bem. Por isso sempre falo da importância da
terapia. Vou falar sobre essa e outras ferramentas importantes no tratamento das crises,
nos próximos capítulos.
A ansiedade é importante para a nossa vida, desde que você a tenha em níveis normais.
A ansiedade normal por exemplo, te protege de situações de perigo antecipando
situações perigosas. Quando esse sentimento excede o limite, se torna o transtorno de
ansiedade te desestimulando e paralisando podendo durar meses. Segue uma tabela
bem intuitiva para te mostrar a diferença entre preocupação normal e transtorno de
ansiedade.
Preocupação normal
• A preocupação não atrapalha o desempenho do seu dia a dia. Você consegue
executar normalmente todas as tarefas programadas para aquele dia.
• Você tem a capacidade de controlar a sua preocupação.
• Você tem um pequeno número de preocupações durante o dia, são preocupações
pequenas e reais.
• O tempo de duração da sua preocupação é curto, durando alguns minutos.
Transtorno de Ansiedade
• Sua preocupação atrapalha e muito o desempenho em
diversas áreas da sua vida, durante o seu dia a dia.
Afetando também até seu relacionamento com as pessoas
que convive.
• Uma boa porcentagem das suas preocupações é
extremamente assustadora e angustiante. Você não
consegue controlar.
• Suas preocupações são diárias e já duram alguns meses.
• É normal você se preocupar com tudo ao seu redor e
esperar sempre o pior de cada situação.
23
Agora que você sabe a diferença entre preocupação normal e transtorno de ansiedade
quero te mostrar quais são os transtornos de ansiedade que existem nos dias atuais.
Compreender a diferença pode esclarecer dúvidas e te auxiliar na busca de um
profissional da área para te ajudar com o tratamento.
Nos transtornos de ansiedades existem quadros como:
• Transtorno do pânico
• Fobia específica
• Fobia social
• transtorno obsessivo compulsivo
• Transtorno de estresse pós-traumático
• Transtorno de ansiedade generalizada
Você vivencia ou conhece alguém que se encaixa em algum desses quadros?
Transtorno de pânico
A intensa sensação de medo é uma das principais características do ataque de pânico é
o medo e a sensação de desconforto durando em torno de dez minutos, seguido por
quatro ou mais dos seguintes sintomas:
➢ Taquicardia e Palpitação
➢ Suor
➢ Tremores
➢ Sensação de falta de ar ou sufocamento
➢ Sensação de asfixia
➢ Dor no peito
➢ Náuseas
➢ Tonturas, sensações de desmaio
➢ Medo de enlouquecer
➢ Medo de morrer
➢ Formigamentos
➢ Calafrios ou ondas de calor
Fobia Específica
Os critérios da fobia específica são;
➢ Medo em excesso de objetos ou situações como por exemplo, voar, ver sangue,
andar de elevador, alguns animais, tomar injeção, etc
➢ Ser exposto ao objeto ou situação da fobia cria uma ansiedade excessiva na hora.
Essas respostas podem ter características de um ataque de pânico.
➢ Os adolescentes e adultos conseguem perceber que os medos são irracionais.
Nas crianças essa percepção pode não existir.
24
➢ Os objetos ou situações que causam fobias são evitados com muita ansiedade e
sofrimento. Mesmo evitando ao máximo as situações, quando são encaradas,
causam uma angustia e um sofrimento desesperador.
Fobia Social
Os critérios da fobia social são;
➢ Um medo descontrolado de situações sociais. Quando o individuo é colocado em
situações de exposição, principalmente quando no ambiente há pessoas
estranhas, fora do seu ciclo social. Para a pessoa com fobia social existe um medo
gigantesco em agir naquilo momento de maneira “ridicula” e “embaraçosa” para
as pessoas que estão a observando. Como por exemplo em uma apresentação
de trabalho ou qualquer outro momento em que você precise se expor, ficar em
evidência.
➢ A exposição a situações como essa gera ansiedade. Na grande maioria dos casso
ao estar exposto a situação fóbica, automaticamente é gerado um estado de
ansiedade podendo tomar a força das características de um ataque de pânico.
Transtorno Obsessivo Compulsivo
Os critérios do obsessivo compulsivo são;
➢ As obsessões são definidas por imagens, pensamentos muito persistentes e
inadequadas fazendo com que o indivíduo sinta muita ansiedade. São
comportamentos repetitivos como por exemplo, lavar as mãos, apagar as luzes,
arrumar algum objetivo ou por atitudes mentais como, orar, cantar ou repetir
palavras.
➢ As obsessões e a compulsão gastam seu tempo e gera bastante sofrimento. O
indivíduo pode ficar horas e horas do dia repetindo os comportamentos e
pensamentos gerando assim prejuízo nos seus afazeres do dia e nas relações do
dia a dia.
Transtorno Pós-traumático
Os critérios do pós traumático são;
➢ A exposição do individuo a um fator que causou morte, dor ou graves ferimentos
a ele mesmo ou a membros da família a pessoa desenvolve um forte medo, sente
impotência e uma extrema dificuldade de lidar com a situação.
➢ Fugir de estímulos dos eventos pós-traumáticos. Com o intuito de não recordar
dos momentos a pessoa tende a fugir de tudo que faça lembrar do evento, dos
pensamentos ou dos sentimentos. Evitando o máximo as recordações do fato.